Em 2010 a Associação Cultural Música XXI quis associar-se às comemorações do nascimento de Manuel Teixeira Gomes. Maria Adelaide é um romance da autoria do escritor portimonense que foi adaptado para teatro por Ana Cristina Oliveira. Nele se evidenciam algumas formas de viver das gentes em Portimão no princípio do séc.XX, fazendo uma recriação das artes de amar da burguesia através do olhar crítico e, por vezes, impiedoso de Teixeira Gomes.
Sobre o texto
A escrita de Teixeira-Gomes é sempre uma grata descoberta para qualquer leitor, mas sê-lo-á, sobretudo, para o leitor menos familiarizado com a sua mundividência, com a sua peculiar forma de assimilar e descrever a vida numa perspectiva repleta de sensualidade. Em Maria Adelaide impõe-se o deslumbramento estético perante o ser feminino a par de uma crueldade masculina, típica do enquadramento cultural da época. Neste texto convivemos com as crenças, com o modo de viver de uma certa burguesia, mas também com o amor envolto num jogo de crueldade que permanecem ao longo das épocas.
Maria Adelaide, obra-prima de Manuel Teixeira-Gomes, é um romance escrito em 1937, no exílio, em Bougie, já no ocaso dos seus 77 anos, quando o viajante, o incontido amante da beleza e da arte, o resignado Presidente da República deixa que o seu olhar se perca pela memória na distância do mar azul da Argélia. E, talvez, esse conjunto de peculiares circunstâncias contribua para a ambiência deste romance entretecido por momentos de profunda amargura e crueldade, porém sempre lúcido e suportado por uma escrita límpida e elegante.
Um dos grandes eixos da narrativa será o da assunção do instinto “natural” que procura realizar-se num triunfo absoluto do princípio do prazer. È sob esta égide que se vão posicionando as personagens construindo uma relação, na essência, desigual entre o rico e a pobre, o homem maduro e consciente do seu jogo e a mulher jovem, quase adolescente, quase “inocente”. E este equilíbrio naturalmente instável adensa-se através de uma relação amorosa de difícil coabitação, em que o objecto do desejo é-o apenas como foco de atracção, enquanto nela se mantiverem estimulantes a frescura do corpo e certa inocência do social e do moral… A jovem sensual obtém o raro privilégio de se sentir profundamente desejada, mas também a amarga contrapartida de não ser reconhecida nem respeitada enquanto mulher!
Maria Adelaide assume-se, assim, como um romance do instinto do desejo, e de tal modo o confessa e denuncia que anula a própria morte e a sua dor para se projectar numa nova descoberta do puro desejo. Como bem nota Urbano Tavares Rodrigues no final do seu prefácio à obra, “É um bárbaro hino aos sentidos, mas não só. É sobretudo um difícil desmascarar do homem e dos seus abismos. O mais desonesto é o mais honesto fim da comédia.”
A versão cénica resgata o equilíbrio das personagens através da intervenção das suas consciências.
Ficha técnica e artística:
Texto: Manuel Teixeira-Gomes
Encenação e adaptação dramatúrgica: Ana Cristina Oliveira
Intérpretes: António Gambóias, Amadias Monteiro, Mafalda Santos e Nádia Gonçalves
Desenho de luz: António Gambóias
Operação de luz: Nuno Silvestre